quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Semana da Inclusão em Loures

Um jantar às escuras e um almoço em silêncio são algumas das iniciativas que decorrem a partir de quarta-feira em Loures, no âmbito da Semana da Inclusão, que pretende alertar consciências para os direitos das pessoas com deficiência.

A Semana da Inclusão decorre entre os dias 30 de novembro e 07 de dezembro e será assinalada em Loures com várias iniciativas que pretendem envolver vários parceiros locais e trabalhadores do município, explicou à agência Lusa a vereadora com o pelouro da Coesão Social, Maria Eugénia Coelho.

Achamos que em Loures é urgente refletir sobre este tema. As respostas no concelho para pessoas com deficiência com mais de 18 anos são nulas. Por isso, queremos com este dia ajude a enriquecer mais a comunidade, proporcionando-lhe experiências concretas”, sublinhou.

Uma das experiências terá lugar na quarta-feira, num jantar que será servido na escuridão e que, segundo a autarca, visa “suscitar a tomada de consciência para as dificuldades e realidades vividas pelos invisuais”.

O jantar, que decorrerá a partir das 20h00 no refeitório municipal de Loures, é dirigido a vários parceiros sociais e locais, entre os quais professores e empresários.

Outra experiência que irá decorrer em Loures será um almoço dirigido aos trabalhadores municipais, durante o qual os intervenientes terão de passar toda a refeição em silêncio, “sem poder trocar uma palavra”.

Irão decorrer outras atividades, como uma mostra bibliográfica sobre livros inclusivos, uma exposição de pintura coletiva e animações de leitura.


Estamos muito otimistas, porque acreditamos que serão iniciativas capazes de envolver toda a comunidade e sensibiliza-la para esta problemática”, concluiu.

Fonte: Observador por indicação de Livresco

Números duros, políticas moles

Foi tornado público que, durante o ano letivo de 2015/2016, se registaram 5051 ocorrências do foro criminal nas escolas portuguesas, isto é, 500 por mês, em média. No ano anterior haviam sido registadas 3930. Sublinho que não se trata de incidentes disciplinares. Foram ocorrências que caem sob a alçada do Código Penal. Cumulativamente, a PSP teve ainda que intervir em mais 2001 situações de outro tipo. Estes números são preocupantes e apelam à reflexão.

Aquando de casos mais graves de violência em meio escolar, verifica-se, por parte das autoridades respetivas, uma propensão para dissimular os acontecimentos. Mas se por um lado sabemos que a tendência para iludir o óbvio foi classificada por Freud como a primeira paixão da humanidade, por outro também sabemos que ignorar a realidade nunca nos salva. Aceitemos, então, que a indisciplina é hoje um dos maiores problemas, se não o maior, do sistema de ensino e que há uma evidente crise de autoridade na escola. Quando a estudamos, são esmagadoras duas situações responsáveis: do ponto de vista interno, a falta de coragem para adotar políticas adequadas à solução dos problemas, materializada pela manutenção de uma lei inadequada que introduziu no processo disciplinar o método processual penal, com um cortejo de prazos, audições e garantias pedagogicamente desadequadas, permitindo a proliferação de pequenos marginais; do ponto de vista externo, a crescente demissão dos pais para imporem disciplina aos filhos.

A maioria dos pais de filhos indisciplinados não gostaria de ter filhos indisciplinados. Mas não sabe ou não pode discipliná-los. Os restantes são negligentes, que não se interessam pelos filhos e são, eles próprios, quantas vezes, marginais.

Os alunos indisciplinados criam problemas graves, que perturbam a vida da comunidade. A escola deve fazer o possível para os ajudar. Mas antes tem a obrigação de proteger os outros e não permitir que os primeiros lhes tornem a vida impossível. A palavra-chave de uma estratégia de atuação é responsabilizar. Não é ignorar, branquear, contemporizar.

Os jovens são seres que vivem de modo particularmente intenso e até tumultuoso as suas emoções. Os adultos têm mecanismos de regulação dessas emoções. Os jovens, em processo de formação, procuram-nos. Se em casa não os encontram, temos que dar instrumentos à escola para enfrentar o obstáculo.

O empirismo de qualquer vida vivida (a redundância é propositada) dispensa a cultura psicológica mais erudita para sabermos como tem que ser. Numa primeira fase os comportamentos são regulados a partir de fora: são os pais, são os professores, são os adultos que atuam, que moldam. Num segundo momento, de co-regulação, o ser em crescimento vai aprendendo, na interação com os outros, a dominar-se e respeitar os pares (sem dispensa da atenção cuidada e, sempre que necessário, ativa e interventiva, do adulto). Para chegar, por fim, à autorregulação, estádio maturo e autónomo em que, sozinhos, encontramos o nosso equilíbrio social.

Simples? Não, complexo. Sobretudo quando os políticos não percebem que tratar isto exige uma longa “linha de montagem”, que requer pessoas com tempo e meios para apertar os “parafusos”.

Dispendioso? Talvez não, se se derem conta que dispensa muitos envios para o “controlo de qualidade”. E, mais ainda, se se derem conta que os produtos acabados desta “linha de montagem” são pessoas. Isso, pessoas!

Uma forma de ignorar o problema da indisciplina é não o assumir como coisa da sociedade e da Escola e torná-lo coisa do professor, cuja função é mediar a aprendizagem dos alunos e não gerir conflitos provocados por comportamentos disruptivos. Tenhamos presente que essa função principal é constantemente secundarizada, quando não anulada, pela indisciplina e que grande parte do tempo lectivo é ocupada com a gestão de conflitos, quando devia ser usada com a gestão das aprendizagens.

Santana Castilho 

Professor do ensino superior (s.castilho@netcabo.pt)

Fonte: Público

terça-feira, 29 de novembro de 2016

Afinal, o que é que a escola faz pelos bons alunos?

Nem todos os alunos são iguais ou têm as mesmas necessidades. Uns precisam de ajuda para levantar as notas, outros para as subir ainda mais – e as manter altas. Há escolas públicas que não ignoram a excelência e criam turmas com os melhores alunos, insistem nas disciplinas de exame, focam-se no sucesso. De norte a sul do país, são ninhos que dão asas a quem quer voar mais longe.

Íris é a mais concentrada do 4º B. Olho claro, cabelo louro, vestida de rosa, é das melhores alunas da turma. Não sabe o que quer ser quando for grande. No ano letivo passado fez parte do ninho dos melhores alunos do 3º ano do Fénix, o projeto com ninhos de desenvolvimento do primeiro ciclo ao ensino secundário em escolas públicas, para alunos de baixo e alto rendimento que temporariamente trabalham em grupo e voltam à turma-mãe.

A rapariga de 9 anos estuda na EB1 do Agrupamento Abel Botelho, em Tabuaço, a duas horas do Porto. O pai é agricultor, a mãe trabalha à volta do mel ou nas adegas do Douro vinhateiro e ela demora todos os dias 45 minutos de autocarro até à escola.

A colega, Joice Cruz, 9 anos, tranças no cabelo, vestido preto e olho vivo, gostou de estar no ninho dos melhores alunos que se juntam na biblioteca. «Gosto de fazer fichas com leitura, fazer textos maiores do que os meus colegas.» Vive com a avó em Tabuaço, os pais estão emigrados na Áustria, fala com eles quase todos os dias, por Skype.

Carlos Azevedo, coordenador do Fénix desde que arrancou em Tabuaço, há três anos, conhece bem os miúdos. Depois de os alunos do ninho de recuperação terem superado tão bem as dificuldades, a escola centrou atenções nos outros.

«Começámos com um grupo-piloto que foi para a frente como ninho de excelência.» Os melhores juntaram-se com objetivos definidos: «Fomentar a criatividade, ir mais além em determinadas matérias, construir um saber mais solidificado.» Naquele ninho, havia tempo para fazer coisas diferentes: pesquisar sinónimos de palavras difíceis no computador, escrever redações maiores, olhar para a tabuada e descobrir pormenores, fazer gráficos mais elaborados para apresentar resultados de um inquérito. «Puxam para fazermos as coisas bem», diz Martim Pinheiro.

Igor Barradas quer ser futebolista, está a aprender a tocar bateria e recorda-se da tabuada dos nove e da «técnica de fazer contas sem puxar pela cabeça». Sentia-se bem no ninho. «Fazíamos um pouco mais do que os outros, textos maiores, gráficos maiores.» A mãe ficou orgulhosa quando o filho lhe disse que ia para aquele projeto. «Ele é bom aluno, tem capacidades, e fiquei contente que fosse tratado como tal. Chegava entusiasmado a casa, dizia que fazia trabalhos de puxar pela cabeça.»

Os melhores não podem ser esquecidos. É essa a posição de Berta Amaral, diretora do agrupamento de Tabuaço. «Um dos desafios da escola pública é apostar na qualidade. Os alunos que têm mais dificuldades precisam de nós para terem sucesso e os melhores têm de ser motivados.»

Em Tabuaço, não há olhares de lado. «Ninguém encara os ninhos como medida discriminatória, mas como uma medida que os ajuda a compreender as coisas», acrescenta o professor Carlos Azevedo. O objetivo «é não deixar ninguém para trás: nem os bons nem os maus». Para este ano letivo de 2016-2017, a escola ainda está a avaliar se terá um ninho de recuperação ou de excelência.

O Fénix tem ninhos de excelência em escolas de todo o país. Na EB1 de Afonsoeiro, no Montijo, por exemplo, vinte alunos de duas turmas do 4º ano estiveram num desses ninhos. Teresa Mouzinho, coordenadora do primeiro ciclo do Agrupamento Poeta Joaquim Serra, fala de alunos com competências estimuladas. «Se estão numa turma que não consegue chegar às suas capacidades é natural que se sintam desmotivados.» Os alunos fizeram pesquisas sobre escritores, desenvolveram a oralidade, apresentaram trabalhos. «No bocadinho que estão nos ninhos conseguem ir mais além. Trabalhando com esta metodologia conseguimos que os alunos ganhem autoestima e façam o máximo.»

Mas não é só o Fénix que tem respostas para os bons alunos. A Escola Secundária João Gonçalves Zarco, em Matosinhos, tem um projeto único.

Chama-se Pós-Zarco e, no secundário, tem uma turma em cada ano com os melhores alunos – candidatam-se, as notas contam para a seleção, há uma entrevista feita por professores. Essas turmas têm mais uma hora de apoio por semana a cada disciplina de exame.

David Teixeira é um dos 25 alunos da turma do 12º ano do Pós-Zarco. Os colegas chamam-lhe «pequeno génio» e a alcunha assenta-lhe na performance escolar. Tem 16 anos e média de 19,2 no 11º ano. E um objetivo na cabeça: tirar 20 nas cinco disciplinas do 12º ano. É determinado, aluno de excelência, deverá escolher Engenharia Mecânica quando acabar o liceu. «Os alunos do secundário têm de estudar se querem ter uma boa média.» É o que faz, não em demasia, admite, porque é preciso tempo para sair e divertir-se com os amigos.

A turma de David foi escolhida a dedo, os melhores dos melhores, mas ele garante que não há competição na sala de aula. Há alunos atentos e professores que não precisam de repetir a matéria. «Os alunos estão ao mesmo nível, os professores são muito bons, e é tudo mais fácil. A pressão não é para sermos melhores do que o colega ao lado. A ideia é sermos melhores do que éramos há um mês. Não vai ser o colega da nossa turma que nos vai tirar o lugar na universidade.»

A colega de turma Filipa Ferreira, 17 anos, média de 18,7 no 11º ano, concorda. «Sabemos porque estamos ali, que não é para brincar e, se não sou tão boa a uma determinada matéria, alguém me vai ajudar. Não somos o cliché dos alunos que só estudam.» Filipa quer seguir Biologia e não esquece o que disse na entrevista para entrar no Pós-Zarco. «Eu quero mais e penso que posso ajudar os outros.» O colega João Romano, 17 anos, média a rondar 18 no 11º ano, admite que é facilmente influenciado pelo ambiente à volta. Se não há quem puxe, João, que quer seguir Engenharia Informática, desmotiva-se.

«Não conseguiria ter tão boas notas se estivesse noutra turma, sinto que o meu potencial está mais bem aproveitado do que no 9º ano. Entendemos a matéria quase sempre à primeira e isso dá-nos tempo para refletir.»

David acrescenta mais exemplos: não há interrupções nas aulas, não há indisciplina, a exigência é maior. «É muito raro a professora de Matemática dar-nos uma fórmula, fazemos perguntas até lá chegar, e chegamos lá porque a fórmula acaba por fazer sentido.»

José Vieira é professor de Físico-Química nas turmas Pós-Zarco e participa na seleção dos alunos. «A média de 16,6 no exame nacional quer dizer alguma coisa», diz. O que é diferente nas turmas Pós-Zarco? «A vontade de aprender e trabalhar. Os alunos fazem o trabalho e vão mais além. São empenhados e exigem mais de quem ensina.»

O Pós-Zarco surgiu em 2005 com o lema «diminuir frustrações». José Ramos, diretor da Gonçalves Zarco, esteve na génese do projeto. «Selecionamos os alunos não só pelas notas, mas também pelos objetivos para a vida.» E faz sentido separar? «Faz se os alunos são diferentes.» Igualdade de oportunidades é, na sua opinião, «dar a cada um o que cada um precisa». Não é usar chapa 5. «As turmas Pós-Zarco são diferentes, os alunos não têm a mania que são bons, são mesmo bons.» O diretor está satisfeito: 57% dos alunos do secundário têm média superior a 14 e 70% do básico média superior a 4. A taxa de sucesso é de 95% no ensino básico e 90% no secundário.

Há, porém, reticências nestas separações. Pedro Rosário, professor na Escola de Psicologia da Universidade do Minho, percebe a vontade de alcançar sucesso rápido quando na sala de aula há diferentes perfis, «a tentação de dividir para tentar controlar melhor a situação, quer para cima quer para baixo». Mas essa divisão, acredita, pode não ser benéfica. «O ideal seria que as escolas não tivessem a tentação de fazer turmas especiais, que podem limitar a convivência e a troca de experiências entre quem tem menos e mais dificuldades. A diversidade é importante. Embora a décalage nas turmas, por vezes, seja tão grande que a partir de determinada altura a convivência parece impossível.»

Para o especialista em psicologia da educação, é preciso ter cuidado para não haver «escolas-hospital e escolas-universidade», que separam consoante o nível de dificuldade ou excelência. «A questão é saber quais as consequências pedagógicas disto.»

Os ajustes devem ter limites. «Estimular todos é dar a cada um o que cada um precisa. Esse é o desafio.» Dar o apoio adequado mas não numa perspetiva disjuntiva.

«Tem de haver janelas para os alunos que precisam de voar e para os que precisam de bater asas a seco, no seu ramo, para colmatar lacunas.»

Em Leça da Palmeira também se separam alunos. Há três anos que o Agrupamento de Escolas Engenheiro Fernando Pinto de Oliveira tem turmas-farol – o farol de Leça é o símbolo do agrupamento – com os melhores alunos do 5º ao 9º ano. Uma turma em cada ano, cada uma com trinta alunos, os que têm as melhores notas no ano anterior e autorização dos pais. São estas as condições do Projeto Farol. No 7º ano, é feita uma nova seleção exatamente nos mesmos moldes.

Os alunos-farol não têm carga letiva extra, aprendem o programa curricular em vigor mas trabalham numa lógica de projeto. Um tema por semestre que os obriga a puxar pela cabeça.

«Os alunos são chamados, várias vezes, a construir conhecimento», diz Jorge Sequeira, diretor do agrupamento. «Há um tema e os conteúdos são trabalhados na lógica de projeto, há sempre um trabalho de investigação e de pesquisa por parte deles.» Não há, assegura o professor, divisões ou turmas de elite. Há também bons alunos noutras turmas. «A título de exemplo, no ano passado, dos trezentos alunos do 5º ano, 150 tinham condições para estar nas turmas-farol.» O projeto é uma forma de responder aos muitos alunos que querem entrar no ensino superior e aos interessados na vida dentro da escola. «A escola tem de dar resposta ao tipo de população que tem e o espírito de competição entre eles é coisa que não existe, há entreajuda, não querem perder colegas.»

Para Joaquim Azevedo, investigador e professor catedrático da Universidade Católica, doutorado em Ciências da Educação, não há uma única maneira de resolver as coisas nas escolas. Há várias e elas devem ser livres, autónomas, responsáveis. Professores e pais devem decidir as práticas mais adequadas. Se um caminho dá resultado e não põe em causa as orientações educativas, então apliquem-se outras possibilidades. «Há escolas que só acompanham os alunos com grande atraso escolar. E os miúdos que ficam ali perdidos no meio?», questiona. Por isso a turma não pode ser o único critério – demasiado administrativo, na sua opinião. «Se um miúdo for muito bom aluno e tem de estar ao ritmo de outros que aprendem com mais dificuldade, está a ser prejudicado. Ao começarmos a trabalhar percebemos que há os que agarram melhor os conceitos e as propostas, que apreendem com muito mais facilidade os conteúdos e podem andar rápido, outros que têm mais dificuldade. E portanto a escola tem de responder a todos.» Como? «Com ritmos diferenciados e grupos diferenciados sem nunca perder a referência da turma.»

FÉNIX: AJUDAR OS ALUNOS NO PAÍS INTEIRO

O Projeto Fénix nasceu em 2007 no Agrupamento de Escolas Campo Aberto, em Beiriz, Póvoa de Varzim, com ideias claras: consolidar conhecimentos e investir no maior desenvolvimento das aprendizagens. Surgem assim os ninhos, espaços que temporariamente recebem alunos com baixo e alto rendimento, do primeiro ciclo ao secundário, para potenciar o sucesso. Neste momento, o Fénix está em mais de 120 escolas, de norte a sul do país, numa média de dois anos de escolaridade por cada estabelecimento de ensino. Desde 2007, cerca de trinta mil alunos usufruíram diretamente do projeto e noventa mil indiretamente – os que ficam na turma acabam por ter outro acompanhamento, acabando também por beneficiar do Fénix. Os ninhos separam temporariamente alunos durante, no máximo, cinco horas por semana, e sempre com regresso assegurado à turma-mãe. Luísa Tavares Moreira, a mãe do Fénix, consultora nacional do projeto, não vê segregação neste modelo. Pelo contrário. «Todos crescem. Não me parece que isso possa segregar.» «Quando voltam ao grupo, os de baixo rendimento já recuperaram as dificuldades que não foram capazes de consolidar no grande grupo. Os de médio e alto rendimento podem ir além do currículo, nas ciências experimentais, na música, em atividades ligadas à criatividade.» As escolas que aderem ao projeto têm autonomia para decidir qual o ninho mais conveniente e podem avançar com os próprios recursos ou pedir apoio. Mas há metas definidas no caso da contratualização com o Ministério da Educação, como reduzir em 15% a taxa de retenção e de desistência e o número de alunos com avaliações inferiores a 4. Se as metas não forem atingidas, as escolas perdem os recursos docentes. As que usem os próprios recursos, definem as metas no âmbito da sua autonomia.

Fonte: Notícias Magazine por indicação de Livresco

Matemática: alunos portugueses do 4.º ano passam à frente dos finlandeses

Portugal ficou à frente da Finlândia nos resultados obtidos pelos alunos do 4.º ano nos testes internacionais de Matemática promovidos pela International Association for the Evaluation of Educational Achievement (IEA), uma cooperativa constituída por organizações públicas e privadas. Este feito foi alcançado em 2015 na sexta edição dos testes que visam avaliar a literacia dos alunos mais novos a Matemática e Ciências, que são conhecidos pela sigla TIMSS (Trends in International Mathematics and Science Study). 

Estes testes realizam-se de quatro em quatro anos. Por comparação a 2011, a média obtida por Portugal a Matemática subiu nove pontos, estando agora na 13.ª posição de um ranking que lista 49 países e regiões, dois lugares acima do que foi alcançado há quatro anos.

Já a Ciências (Estudo do Meio no currículo português), pelo contrário, registou-se “uma descida significativa”: menos 14 pontos de média e descida da 19.ª posição para a 32ª.


No prefácio à edição portuguesa do TIMSS, que é divulgada publicamente nesta terça-feira em conjunto com o relatório internacional, o presidente do Instituto de Avaliação Educativa (IAVE), responsável pela aplicação nacional destes testes, destaca entre as virtudes deste estudo o facto de ele permitir que se conheça, a cada quatro anos, “com que amplitude se alterou a qualidade do desempenho dos alunos em Matemática e Ciências, no final do 4.º ano de escolaridade”. 

No que respeita a Matemática, a aposta na disciplina feita pelo anterior ministro Nuno Crato parece ter dado resultados. Como também se verificou com o Plano de Acção para a Matemática desenvolvido antes por Maria de Lurdes Rodrigues, que apostou sobretudo na formação de professores e que se traduziu neste salto: entre 1995 e 2011, Portugal subiu 90 pontos na média alcançada no TIMSS. (...)

Fonte: Público

segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Mediadores evitam chumbos de 2270 alunos por todo o país

Lançado em 2008 pela Associação EPIS - Empresários pela Inclusão Social, o programa de combate ao abandono e insucesso escolar já conseguiu evitar 2270 retenções. De um total de 22 mil estudantes apoiados, cerca de 10% conseguiu transitar de ano, revela ao JN o diretor-geral da EPIS. No total, foram já investidos 46 milhões de euros.

O pontapé de saída deu-se em 2007, focado no 3.º ciclo (7.º, 8.º e 9.º anos). Foram acompanhados 5812 alunos e, desses, 879 transitaram. Em 2010 dá-se o salto para o segundo ciclo e, passados três anos, é lançado um projeto-piloto no 1.º Ciclo. Uma experiência que vai agora ganhar corpo junto de 1300 crianças, dos seis aos dez anos, em 84 turmas de 47 escolas públicas.

"Todos os anos entram cerca de 100 mil alunos no 1.º ciclo e, passados dois anos, cerca de 10% chumbam", estranha Diogo Simões Pereira. Daí a aposta da EPIS nas bases, através de um rastreio pormenorizado aos seis anos de idade e que lhes diz, logo à partida, que 10 a 15% das crianças apresentam fatores de risco, sejam sociais, de aprendizagem ou de saúde. Daí em diante é desenhado um "plano de trabalho para treinar essas zonas, cujo objetivo último é potenciar essas competências o mais rápido possível para que alinhem com os restantes" colegas, explica.

Porque, alerta o diretor-geral da EPIS, "não faz sentido chumbar alunos até aos dez anos de idade". E desmonta: "As crianças não têm consciência da punição. Não existe um efeito positivo. Pelo contrário, tem é um efeito negativo, porque desvincula-os do seu grupo de influência".

Os principais parceiros da EPIS são as autarquias, seguindo-se o Ministério da Educação e as empresas. O processo é relativamente simples. A Associação coloca um mediador - um professor ou psicólogo com formação dada pela EPIS - nas escolas que irá depois aplicar um questionário (com perguntas sobre a escola, a família, o território) à turma. Conforme explica o mediador da Escola do Cerco (ler em baixo), é "a plataforma que diz quem deve ser apoiado". A partir daí é todo um trabalho feito com a comunidade educativa: alunos, professores, pais, diretores, assistentes sociais.

Ao todo, são 143 mediadores em 166 escolas de 27 concelhos do país, a que se juntam 400 voluntários. Do total investido, 12 milhões de euros foram em contexto de responsabilidade social das empresas (financiam, por exemplo, o salário do mediador EPIS). O custo estimado por "novo bom aluno", aquele que passa de ano, anda na casa dos 3600 euros, explica Diogo Simões Pereira. E sempre com o foco nos grupos mais desfavorecidos. O sonho, esse, admite o diretor-geral da EPIS, seria "eliminar o insucesso escolar logo no final do 2.º ano".

Fonte: JN

Pessoas com deficiência vão poder praticar desportos de neve

A Federação de Desportos de Inverno de Portugal vai apostar no desporto adaptado, depois de ter recebido a garantia do financiamento para o primeiro equipamento, do Instituto Português do Desporto e da Juventude.

A resposta ao apelo dos responsáveis pelos desportos de inverno foi dada na noite de sábado, durante a gala da Federação, quando o presidente do Instituto Português do Desporto e da Juventude (IPDJ), Augusto Baganha, prometeu "num futuro breve" proporcionar a aquisição de uma cadeira de esqui para pessoas com mobilidade reduzida.

"É a primeira vez que em Portugal vai haver uma cadeira deste género. Vamos permitir que o esqui seja um desporto inclusivo e não exclusivo", sublinhou Pedro Farromba, presidente da Federação de Desportos de Inverno de Portugal (FDIP).

Além da compra da cadeira, no valor de cerca de cinco mil euros, é também necessário dar formação para a sua utilização.

Para já, são conhecidos quatro atletas com necessidade deste tipo de equipamento. A sua utilização vai depender do modelo da cadeira e do grau de mobilidade das pessoas.

Pedro Farromba não quis, para já, assumir um projeto para os Jogos Paralímpicos de Inverno, admitindo que a longo prazo esse objetivo possa vir a estar no horizonte.

"Só dou passos pequenos, mas assertivos", acentuou o dirigente.

Presente na cerimónia, o presidente do Comité Paralímpico de Portugal, Humberto Santos, mostrou-se satisfeito com a disponibilidade manifestada pelo IPDJ "para ajudar na aquisição do que pode ser um instrumento importante" para tornar os desportos de inverno mais inclusivos.

"Estão lançadas sementes para que os desportos de inverno para pessoas com deficiência venham a ser uma realidade", congratulou-se Humberto Santos.

A FDIP já tinha tornado pública, em 2013, a vontade de implementar este projeto, mas a ausência de financiamento adiou essa intenção.

Fonte: JN

200 atletas com deficiência intelectual em competição na Covilhã

A natação, o basquetebol, o ténis de mesa e o judo foram as modalidades disputadas nos Jogos, que, na quarta edição, bateram os recordes de participação.

Os IV Jogos Regionais de Inverno do Special Olympics Portugal terminaram hoje e contaram com cerca de 200 atletas com deficiência intelectual, tendo decorrido em simultâneo com os Jogos Adaptados da Cova da Beira.

A natação, o basquetebol, o ténis de mesa e o judo foram as modalidades disputadas nos Jogos, que, na quarta edição, bateram os recordes de participação.

Para Pedro Serra, diretor técnico da organização Special Olympics, esta é uma forma de incentivar a prática desportiva.

"Este evento representa a possibilidade de estes jovens terem atividade física e desportiva, muitas vezes negligenciada. Felizmente, na beira interior já começamos a ter muitas instituições associadas que valorizam esta componente tanto como nós", realçou Pedro Serra.

O responsável dos Special Olympics sublinha os benefícios dos Jogos no desenvolvimento de outras capacidades.

"Nós não pensamos apenas na parte desportiva, mas também na parte social. Temos resultados de sucesso com jovens que têm dificuldades de comunicação, com diagnósticos como o autismo, que depois se revelam nestes momentos", exemplificou.

Uma ideia reforçada por António Marques, presidente da Associação de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental da Covilhã, entidade organizadora, que destaca os ganhos não apenas do ponto de vista físico, "mas também na sua autoestima e personalidade".

"Nos jovens com deficiência intelectual tem um impacto muito grande, como tem por exemplo a música. São atividades com impacto interessante e quase imediato", salientou António Marques, acrescentando que, embora existam classificações, isso não é o mais importante neste tipo de evento desportivo.

João Neto, técnico de desporto, enfatiza o papel da atividade física como ferramenta para a inclusão, através da socialização com outras instituições.

Steven Sá, 25 anos, já participou nos Jogos Europeus, mas os dois dias na Covilhã dedicados ao desporto, confessa, tiraram-lhe o sono.

"Ter aqui tanta gente significa ter mais companhia nas atividades. Não dormi a pensar na prova seguinte, mas depois lá consegui apanhar o sono. Foi um dia cheio, gostei muito", salientou o especialista em atletismo, mas que desta vez participou na natação, judo e basquetebol.

Fonte: Desporto Sapo por indicação de Livresco

SEMINÁRIO: “DESPORTO COMO FATOR DE INCLUSÃO”

A importância da prática desportiva por parte dos cidadãos com deficiência está em análise num seminário que decorre nos dias 2 e 3, no Fórum Municipal Luísa Todi, em Setúbal.

O encontro “Desporto como Fator de Inclusão”, organizado pela Câmara Municipal, no âmbito de Setúbal Cidade Europeia do Desporto 2016, pretende abordar as vantagens da atividade física nas pessoas com deficiência, independentemente do nível de prática alcançado e numa perspetiva terapêutica, educativa, de lazer e de alto rendimento.

Atletas, treinadores e técnicos ligados ao desporto adaptado abordam diversas modalidades desportivas e diferentes tipos de deficiência, nomeadamente auditiva, visual, motora e intelectual.

Está ainda prevista uma reflexão direcionada sobretudo para a discussão da importância do exercício físico em pessoas que sofreram transplantes de órgãos.

O encontro tem início no dia 2, às 09h30, com uma sessão de abertura que conta com intervenções da presidente da Câmara Municipal de Setúbal, Maria das Dores Meira, do adjunto do Gabinete do Secretário de Estado da Juventude e do Desporto, Diogo Nabais, e do presidente do Comité Paralímpico de Portugal, Humberto Santos.

Segue-se uma conferência, às 10h00, moderada por José Lima, coordenador do Plano Nacional de Ética no Desporto, na qual intervém o vereador com os pelouros do Desporto e da Inclusão Social na autarquia, Pedro Pina.

Na mesma conferência, Nuno Januário, professor da Faculdade de Motricidade Humana da Universidade de Lisboa, aborda o tema “Prática Desportiva em Pessoas com Deficiência”, e António Neves, embaixador do Plano Nacional de Ética no Desporto, fala sobre “Ética Desportiva e Deficiência”.

“Sentir a Prática Desportiva” é o tema do primeiro painel, com início às 11h30, que tem como moderador o jornalista e escritor Nelson Nunes, e conta com os testemunhos de judocas surdolímpicos, de uma praticante de goalball e do ex-pugilista Jorge Pina, que perdeu a visão e dedicou-se, entretanto, ao atletismo.

Da parte da tarde, o tema “Mente e Desporto” é abordado e dois painéis, com moderação de Maria José Sobral, professora especializada em Educação Especial, às 14h30m, e da jornalista Lídia Cristo, a partir das 16h30m.

O encontro prossegue no dia 3, às 10h00, com “Importância do Exercício Físico no Pré e Pós-Transplante”, painel que conta com testemunhos de atletas e especialistas nesta área.

Na parte tarde, após um momento musical com o Ensemble Juvenil de Setúbal, dirigido por Rui Borges Maia, com início às 14h30m, há um quinto painel que aborda o tema “Adaptar, Recriar e Praticar”, com a partilha de experiências de técnicos, treinadores e atletas de diversas modalidades de desporto adaptado.

A sessão de encerramento, agendada para as 16h30m, está a cargo do vereador Pedro Pina.

A participação no seminário “Desporto como Fator de Inclusão”, aberto à população em geral e com interpretação em língua gestual portuguesa, está sujeita a inscrição, até 30 de novembro, na Divisão de Inclusão Social da Câmara Municipal de Setúbal ou através do telefone 265 545 170, do fax 265 545 179 ou do correio eletrónico disoc@mun-setubal.pt.

A iniciativa conta com as parcerias da 20 Desafiar Associação, da Associação Portuguesa de Insuficientes Renais, da Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental de Setúbal, do Agrupamento dos Centros de Saúde da Arrábida, da Associação Portuguesa para as Perturbações do Desenvolvimento e Autismo de Setúbal e do Instituto Português do Desporto e Juventude.

Fonte: CMS/Zoomonline por indicação de Livresco

domingo, 27 de novembro de 2016

"Por um verdadeiro Serviço Nacional de Educação": entrevista ao Ministro da Educação

JL: Está prestes a completar um ano de mandato. Que “balanço” faz deste seu primeiro ano como ministro da Educação?
Tiago Brandão Rodrigues: Faço um balanço muito positivo, à imagem da serenidade e da positividade que pautou o início deste ano letivo. Este ano foi importante para recentrar as políticas educativas tendo em consideração: o sucesso dos alunos; o respeito pelos docentes; o envolvimento da comunidade educativa e a responsabilidade perante os cidadãos que, não esqueçamos, exigem que o Estado promova uma Educação que devolva com excelência o investimento que fazem.

São esses principais objetivos da legislatura?
Concluímos agora o primeiro quarto de uma legislatura que tem, na educação, um caderno de encargos conhecido: vencer as inaceitáveis taxas de retenção através de um verdadeiro plano de promoção do sucesso escolar; promover, desde o pré-escolar, este sucesso reforçando a equidade e, assim, superando a determinação socioeconómica ainda demasiado presente no fracasso ou sucesso dos nossos alunos; revalorizar a função docente, deixando de ver quem é essencial à Educação como seu inimigo; educar ao longo da vida todos aqueles que desejam e merecem ter a Educação como um serviço público de qualidade, independentemente da idade que tenham; e, finalmente mas jamais em último, ajudar a qualificar os portugueses para que todos encontrem, na economia e na sociedade portuguesas, o lugar em que podem ser mais úteis. Ou, dito de outra forma, em que podem ser mais felizes e assim contribuir para que a nossa economia seja mais competitiva e a nossa sociedade mais coesa.

Podemos dizer que foi um ano de inflexão de medidas tomadas pelo anterior ministro, Nuno Crato?
Não o vejo assim. Podemos dizer que foi um ano de regresso da paz ao setor da Educação e, sobretudo, às Escolas. Foi um ano de devolução de normalidade aos alunos, pais, famílias, docentes, funcionários e comunidade educativa em sentido lato. Um ano em que, tranquila mas decididamente, se voltou ao paradigma que Portugal seguia há quase duas décadas em termos de políticas educativas. Um regresso ao paradigma nacional e às boas práticas educativas europeias, o que implicou parar o experimentalismo nas ideias e o ataque aos recursos que a Educação havia sofrido durante o Governo anterior.

A que “experimentalismo” se refere?
Ao que levou Portugal a ser o único país europeu que segregava crianças enquanto ainda estavam no Ensino Básico para lhes dizer que apenas teriam acesso a um destino, quase cinicamente chamado vocacional, diferente e menor do que o destino de todos os outros alunos. Portanto, este só foi um ano de reversão para aqueles que consideravam o experimentalismo neoliberal o único paradigma da Educação a que Portugal tinha direito, ou seja, uma escassíssima e radicalizada minoria. Felizmente, a maioria considera que Portugal merece mais e melhor Educação.

Trouxe um novo modelo de avaliação, que pôs fim aos exames dos 4º e 6º anos (Português e Matemática); introduziu provas de aferição nos 2º, 5º e 8º anos (Português, Matemática e Estudo do Meio); e manteve os exames do 9º ano (Português e Matemática). Como “avalia” o novo modelo de avaliação no que diz respeito à sua receção e aplicação por parte das escolas?
Não é a mim que cabe avaliar. Quem o “avaliou” foi a maioria dos diretores, e das suas Escolas, que, apesar de este ser um ano de transição, decidiu já fazer estas provas em 2016. Avaliam-no também os alunos das escolas que realizaram as provas, fazendo estas provas em taxas semelhantes – e por vezes superiores – às dos alunos que obrigatoriamente se submetem a exames nos anos e disciplinas em que estes têm lugar. Quem o avalia, agora, são os professores e os encarregados de educação que têm acesso a uma ficha pessoal e pormenorizada que realmente afere a aprendizagem dos seus alunos e educandos. Quem o avaliará, de seguida, serão as escolas e professores que poderão, com base na aferição promovida - exatamente a meio de cada um dos três ciclos do Ensino Básico e a todos os saberes – conhecer o que e como cada um aprende o que lhe devemos ensinar, nomeadamente através do trabalho que os Relatórios Individuais e de Escola potenciam.

Manter-se-á este modelo de avaliação?
Sim. O regresso ao paradigma nacional de aferição universalizar-se-á, conforme previsto, neste ano letivo e continuará a, rotativamente, cobrir todas as áreas de ensino para que a melhoria nas aprendizagens seja tão global quanto é a Educação.

Outro exemplo da mudança foi a redução do financiamento aos colégios privados com contrato de associação, que gerou dois movimentos tão fortes quanto distintos: um em defesa dos colégios e da chamada “liberdade de escolha”; outro em defesa da Escola Pública. Como olha para este fenómeno?
Com a calma e a certeza de quem olha, e vê, e compreende o que dizem a Constituição e a Lei de Bases do Sistema Educativo, e com a ética de quem concebe o Estado como pessoa de bem. O Estado cumpre o que contratou para poder garantir a Educação onde, de outra forma, ainda não o consegue. Procuramos cumprir cada vez mais, e melhor, a Lei de Bases que prevê, e bem, a oferta aos cidadãos de uma educação pública de qualidade em todo o território nacional. Fazemo-lo de acordo com o quadro constitucional existente, que prevê: a progressiva gratuitidade; a cobertura, através de uma rede de estabelecimentos públicos, das necessidades de ensino da população por todo o nosso território; e, também importante, o reconhecimento do ensino particular e cooperativo, bem como a sua fiscalização.

Esta é, para si, uma questão ideológica?
É, antes de mais, uma questão de cumprimento da legalidade e de gestão criteriosa dos recursos públicos. De legalidade no que toca à Constituição, à lei-quadro e aos contratos vigentes. Questão ideológica só para aqueles que, ideologicamente, querem reabrir uma discussão sobre a plenitude da Lei de Bases. Não é o nosso caso. Para nós não é ‘ideologia’ cumprir a Constituição e a Lei de Bases. É um dever. E, já agora, um prazer.

Certo é que se trata de uma política que reflete uma perspetiva sobre a Educação e a Escola muito diferente da do Governo anterior. Está em causa um novo olhar sobre a Escola pública? Ou, para usar uma expressão sua, a defesa do Serviço Nacional de Educação?
Ser ministro da Educação em Portugal implica uma grande responsabilidade em todos os minutos da sua ação: conciliar o dever público com a decisão sobre como melhor alocar, fiscalizar e potenciar os recursos dos contribuintes, tendo em vista a finalidade para a qual estes nos confiam os seus impostos - o bem público na Educação. E importa-me fazê-lo tendo como horizonte o que melhor serve a aprendizagem com sucesso e equidade de todos os nossos alunos e tendo como prática o cumprimento estrito da legalidade.

Reduzir o financiamento do ensino privado e cooperativo foi então ‘cumprir a lei’?
Foi. Os contratos de associação surgiram há já 20 anos, não como uma solução de financiamento do Estado aos estabelecimentos particulares e cooperativos, mas porque o Ministério da Educação estava em falta com o país. Nessa exata medida, e não noutra, contratou privados, cuja qualidade foi validada, para assegurarem transitoriamente algo que o Estado sempre viu como a sua obrigação: ter uma rede escolar pública o mais alargada e coerente possível em termos financeiros e de sustentabilidade.

A rede de escolas públicas é hoje capaz de dar uma resposta mais abrangente e sólida do que há duas décadas? 
Sem dúvida. Com o alargamento e a requalificação, em que o país tanto investiu, a rede escolar está agora natural e saudavelmente mais coerente e completa do que há 20 anos. Ainda assim, é preciso salientar que a rede continua a ser requalificada - aliás, acabámos de contratualizar com as autarquias mais de 200 intervenções para os próximos três anos. Sendo que este trabalho continua a ser feito, para que mais municípios se juntem a este esforço de modernização da nossa rede de escolas. Ainda bem que o Estado cumpre o seu dever. Ainda bem que fomos capazes de dar um salto significativo na realização do que sempre esteve previsto na Lei de Bases: o tal Serviço Nacional de Educação de que falo. Depois de ter usado esta expressão, já a vi ser usada por outros. Fico contente por isso! Este é um salto de que só nos pode orgulhar.

Depois deste primeiro ano em que procurou “corrigir” o que considerou serem “erros” do anterior ministro, em que se concentrará neste ano letivo 2016/17? O que está neste momento “em cima da mesa”?
Em 2017, vamos continuar o nosso trabalho “maratoniano” para cumprir o desígnio político principal que aparece, de forma marcada, no Programa do Governo: combater o insucesso escolar e garantir os 12 anos de escolaridade com equidade.

O que está a ser feito nesse sentido?
Sabendo como os primeiros anos são importantes na educação das crianças e um preditor determinante do sucesso escolar, foi lançado todo um trabalho de conceção de orientações pedagógicas do zero aos seis anos, em dois modelos: zero aos três e três aos seis. Deste modo, iniciámos já a universalização do pré-escolar aos três anos, com a concretização aos quatro no presente ano letivo, e com a conclusão sequencial deste objetivo até ao último ano da legislatura. Em 2017, cumpriremos melhor a escolaridade obrigatória de 12 anos, dotando-a de maior sentido ao propor a criação de um perfil que indique a quem ensina e a quem aprende que perfil de competências deve a escola assegurar a quem a frequenta. Este referencial, comum aos diferentes percursos do Ensino Secundário, será construído de forma participada ao longo deste ano letivo, com vista à sua concretização em 2017/18. Além disso, depois de termos resolvido os pagamentos em atraso no ensino artístico e profissional, definido um calendário e adotado procedimentos corretivos capazes de evitar novos atrasos no futuro, importa, em 2017, definir a rede de oferta de formação profissional para que seja mais bem articulada, mais racional e eficaz.

Os alunos do 1º ano do Ensino Básico tiveram este ano manuais escolares gratuitos. É uma medida que contribui para a “equidade” de que fala? 
Precisamente. Iniciámos um exigente caminho de gratuidade dos manuais para que todos possam ir à escola durante os 12 anos. E já temos inscrito, para 2017/8, essa gratuidade para todo o 1º ciclo. É um passo muito importante. Além disso, nada é mais essencial ao efetivo cumprimento dos 12 anos de escolaridade obrigatória do que a promoção do sucesso escolar.

Já lá vamos. Ainda sobre os manuais escolares: que importância atribui à sua reutilização – como ocorre em países mais ricos do que Portugal e como já foi recomendada pelo Conselho Nacional da Educação?
Iniciado e em marcha este caminho de que estamos a falar, importa, desde já, consciencializar todos, desde logo os alunos, que este investimento do Estado na sua educação, com a proporcional devolução de rendimentos às suas famílias, merece que se esforcem ainda mais para ter sucesso e que tenham uma maior preocupação em cuidar dos meios que o Estado lhes confere. Daí a aposta no compromisso assumido por encarregados de educação e pelos alunos de reutilização dos manuais escolares sempre que tal seja possível, da mesma forma que se “reutilizam” e se renovam as escolas, os professores, os saberes. Seja nos recursos materiais seja nos valores imateriais, trata-se de quem beneficia desse investimento poder e saber cuidar dele o melhor possível. Temos consciência de que não será um caminho linear nem fácil. E por muito que a inação preserve mais quem decide das críticas, esta equipa está bem consciente que o caminho apenas se faz caminhando.

Falemos agora do (in)sucesso escolar. Anunciou recentemente o Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar. Porquê?
Portugal não poderá ser uma economia competitiva e uma sociedade coesa enquanto um terço de nós conhecer da Escola apenas a Escola do insucesso. O país não se pode permitir o luxo e o desperdício de ter uma Escola do insucesso que, em vez de diminuir, aumenta, como mostram os últimos dados relativos aos 2º, 7º e 10º anos de escolaridade. O insucesso no 2º ano de escolaridade atinge os 10% de alunos retidos e, nos últimos dois anos, duplicou o insucesso nos anos de transição de ciclo, 7º e 10º. Enquanto este falhanço for, como os dados igualmente comprovam e ao contrário do que acontece em muitos países europeus, estatisticamente quase determinado em função do contexto económico, social e cultural do aluno, a Escola do Sucesso será uma miragem, minando o projeto de Portugal como país de sucesso. Porque a necessidade é grande, a resposta da nossa parte é ambiciosa.

Como é? Em que consiste?
O Programa age sobre tês eixos: a autonomia das escolas na definição de planos locais de intervenção; a formação contínua; e o envolvimento das comunidades e a gestão de projetos curriculares próprios. Foi implementado um programa de formação das lideranças intermédias das escolas para a definição de estratégias locais de intervenção. A par disso, estamos a capacitar os CFAE [Centros de Formação de Associação de Escolas] para que os docentes possam voltar a usufruir de formação contínua de forma gratuita, em resposta às necessidades identificadas nos seus diagnósticos. Destes planos de ação e de formação contínua resultaram várias centenas de medidas próprias, ajustadas aos contextos locais. Os planos irão articular-se com os projetos das Comunidades Intermunicipais e das Autarquias para promoção do sucesso escolar e combate ao abandono. Queremos que as aprendizagens melhorem e como consequência os níveis de retenção diminuam.

Para isso é preciso envolver toda a comunidade educativa.
É fulcral, para que as Escolas possam responder de forma atempada e eficaz às dificuldades dos alunos. Por isso o Plano envolve toda a comunidade educativa, a rede de instituições de ensino superior, as autarquias e a sociedade civil. Para que de cada aluno se conheçam as dificuldades e capacidades e para que a cada aluno possamos adequadamente responder com uma gestão flexível do seu currículo. Que é do aluno mais que da Escola e muito mais que do Ministério.

No entanto, junto de imensos alunos prevalece a ideia de que “a escola é uma seca”. Segundo a OCDE, há mesmo, hoje, menos alunos a gostarem da escola do que há uns anos. Têm sido apontadas causas como excesso de matéria, programas inadequados à idade, pressão dos exames, efeitos nefastos do insucesso e das retenções… Que fazer?
Temos em marcha um plano de trabalho para definição das aprendizagens essenciais, atacando o problema identificado de estarmos perante um currículo obeso, com tantos conteúdos que se torna inexequível. Esta concentração nas aprendizagens mais relevantes permitirá uma flexibilidade na gestão curricular que potencia a sua adequação a contextos específicos; o desenvolvimento de competências associadas aos trabalhos de projeto; o cumprimento da dimensão inclusiva da educação; o aprofundamento de alguns temas; e a promoção de trabalho interdisciplinar.

Em que ponto está a atribuição de 25% do currículo à gestão das escolas?
Está a ser preparada no quadro das alterações legislativas que enquadrarão a gestão flexível do currículo quer na dimensão disciplinar, quer no tempo da matriz deixado ao critério dos projetos educativos de escola e de turma. Pretende-se que estes 25% sejam, essencialmente, dedicados a projetos interdisciplinares, a trabalho experimental, de cidadania, temático.

Como reduzir a carga horária dos alunos do 1º ciclo ou reequilibrá-la melhor entre várias áreas e tipos de aprendizagem?
Há duas questões. Por um lado, ao reafirmarmos a monodocência como essencial no 1º ciclo, estamos a permitir que o principal instrumento de integração entre áreas curriculares seja efetivado. Por outro lado, no âmbito do trabalho em curso sobre o currículo e a sua gestão, uma das matérias em cima da mesa é a discussão sobre a carga horária semanal, de todos os ciclos, não só do 1º.

Anunciou também um novo regime de “tutorias”, que pretende ser uma alternativa ao ensino vocacional. De que forma? Como se processam estas “tutorias” na prática? Já estão a acontecer nas escolas? Em que medida podem combater o insucesso escolar?
As tutorias não devem ser vistas como uma alternativa ao ensino vocacional. A única coisa que têm em comum é serem abrangidos os mesmos alunos que poderiam ser encaminhados para cursos vocacionais, isto é, aqueles que acumulam duas ou mais retenções. As tutorias oferecidas pretendem ser uma medida de apoio aos alunos numa perspetiva socioemocional, de apoio à sua relação com a escola e com as aprendizagens, para que possam identificar o que os levou a ter percursos de insucesso e a encontrarem formas de inverter esse percurso. As tutorias já estão a acontecer e a ser acompanhadas por um programa de formação, promovido pela Direção-Geral da Educação. Estruturam-se em dinâmicas de grupo, para que cada aluno possa, junto do seu grupo, desenvolver as competências de autorregulação em conjunto com os seus pares.

São conhecidas as graves carências na educação de adultos. Como atender a diferentes necessidades e sobretudo ao direito de todos à Educação e ao autoaperfeiçoamento permanente?
O Programa Qualifica, lançado em agosto, visa recuperar o caminho interrompido na formação e qualificação de adultos. Os défices de qualificação da população ativa do país são um dos principais problemas estruturais de Portugal. Ao inscrever a qualificação dos adultos no Programa Nacional de Reformas, o Governo pretende reinvestir nos adultos, assegurando-lhes percursos de orientação, formação e certificação. Para isto, estamos já a expandir a rede de Centros Qualifica, a trabalhar na creditação e modularização de toda a formação de nível Secundário e a criar instrumentos para a orientação, como o Passaporte Qualifica. Obviamente que este programa implica a abertura de novos cursos EFA [Educação e Formação de Adultos] e a possibilidade de frequência de diferentes módulos de aprendizagem ao longo da vida.

Fonte: Visão por indicação de Livresco

sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Cyberbullying em jovens no meio escolar

A internet veio para ficar. Os jovens são os consumidores diários com mais disponibilidade para estar online e também os mais vulneráveis a riscos e a possíveis danos.

Cumprem online uma das tarefas mais importantes para o seu saudável desenvolvimento: a socialização.

Pertencer a um grupo é imperativo. Estar sempre online é o principal requisito.

E assim vão deambulando entre uma socialização a que chamo de presencial e digital, isto é, uma socialização mista. Esta é a visão otimista e glamorosa do retrato da vida dos jovens.

O problema surge quando só apostam na socialização digital (dependência de estar online) e/ou apostam na socialização digital de forma a causar sofrimento no outro, ter um meio de diversão e tornarem-se populares (isto é, cyberbullying).

Os estudos e a experiência clínica apontam para um cenário terrífico nas teias relacionais entre jovens, que pertencem ou não à mesma escola, à mesma turma, ao mesmo ciclo de amigos.

O cyberbullying é uma realidade inevitável. Não há força física, não há medo da descoberta, não há feedback do sofrimento da vítima, e existem muitos seguidores, uns que estão do lado do agressor, outros que defendem a vítima e, também, os indiferentes. Mais raramente existem os defensores, aqueles que tentam interceder a favor da vítima.

É uma forma de diversão realizada pelos cyberbullies, que se apresentam como frios e poderosos, com uma identidade falsa ou, por vezes, fazendo-se passar por incógnitos, e que assim se tornam muito populares e temidos.

O bullying ganhou uma nova ferramenta de atução, as tecnologias de informação e comunicação, e está só à distância de um click. É mais fácil e rápido de pôr em prática.

Até podem ser desencadeadas situações de bullying face a face, mas rapidamente ganham outra dimensão online.

O cyberbullying surge nas redes sociais, nas mensagens, nos blogues, no e-mail. Pode surgir de várias formas: pela passagem de informação ou imagens privadas (que podem ser de cariz sexual), tornadas acessíveis a todos, pelo envio repetido de mensagens agressivas e de humilhação, revelando ou não a identidade, pela exclusão de um determinado grupo e pelo roubo da identidade, de forma a enviar informação que danifique a reputação.

Tudo fica registado, para sempre. Uma espécie de pegada digital, com contornos muito negativos e nefastos para as vítimas. Este aspeto está longe de ser consciencializado pelos jovens. Não têm noção de que o impato está para além daquele dia, daquele mês, daquele ano.

Um dos fatores que mais contribuem para a existência do cyberbullying são as rápidas competências tecnológicas que os jovens adquirem, e as dificuldades no desenvolvimento de competências sociais e relacionais, exponenciadas pela falta de apoio familiar e da comunidade escolar envolvente.

Há um trabalho importante a fazer com os jovens, os pais e os professores para um rastreio precoce do cyberbullying.

É muito importante que o jovem tenha um espaço para falar do que se está a passar, como se está a sentir, que estratégias já possui e quais deverá desenvolver para enfrentar a situação.

O silêncio é o pior remédio. Mas muitas vezes é aquele que é mais usado. Faz aumentar o cyberbullying para proporções de sofrimento inimagináveis.

As alterações nos resultados escolares, no comportamento em casa e na escola com os amigos e na sala de aula são importantes sinais de alarme.

Às vezes, o cyberbullying é a ponta do icebergue, de outras vulnerabilidades que os jovens apresentam: agressores e vítimas. Todos apresentam características de certa forma semelhantes, relativas à escassez de apoio familiar e nas dificuldades nas relações com os pares, uns por maior isolamento, outros por guerrear o poder.

Todos precisam de ajuda!

Ivone Patrão

Fonte: DN por indicação de Livresco

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Educação: não tratar igual o que é diferente

Muitos anos foram precisos para que a Educação chegasse a todas as crianças. Houve grupos que chegaram mais cedo por terem nascido em famílias que valorizavam e tinham recursos para assegurar a educação dos seus filhos, outros chegaram mais cedo porque moravam em regiões onde a escola pública se estabeleceu primeiro, outros ainda, chegaram mais cedo por causa do seu género. Apesar de Martinho Lutero (1483-1546) já ter preconizado a educação tanto para rapazes como para raparigas, o certo é que este desiderato levou centenas de anos a ser cumprido e, mesmo assim, com os rapazes a terem durante muitos anos melhor acesso à escola que as raparigas. Este esforço de universalização da Educação a todas as crianças foi um esforço longo, custoso e que, no nosso país, só recentemente se pode considerar bem-sucedido.

Talvez todo este esforço de proporcionar Educação a todas as crianças tenha reforçado a ideia que a Educação era um bem indiferenciado que ou se tem ou se não tem. Só depois deste longo e penoso esforço estamos agora na fase de, consistentemente, perguntar qual a educação que deve chegar a todos. Por analogia, só depois de a água chegar a todas as casas se começa a questionar a qualidade dessa mesma água. Hoje, o debate público na educação é sobre a sua adequação à contemporaneidade, a sua adequação aos interesses e capacidades dos alunos, a sua pertinência para preparar cidadãos conhecedores e humanamente cultos para participarem em sociedades complexas. É uma evidência que a Educação de hoje não se cumpre só por ser universal: a Educação de hoje só pode ser útil e pertinente se alterar velhos e bafientos paradigmas que demasiado tempo foram julgados como inquestionáveis.

Não temos hoje dúvidas sobre a importância da escola. Não temos, mas já tivemos antes. Há algumas décadas a preocupação era se a escola pode mesmo reduzir as desigualdades que são geradas pelos contextos económicos, culturais e sociais de onde as crianças são provenientes. Hoje este debate está ultrapassado. No passado mês de junho a revista The Economist tratou extensamente qual o papel da escola e dos professores no tecido social. Concluiu-se pelo papel decisivo – quase surpreendentemente decisivo – que as escolas e os professores podem desempenhar. Afirma-se por exemplo que “um só ano de ensino dos 10% dos melhores professores tem um impacto três vezes maior na aprendizagem dos seus alunos que o impacto causado pelos 10% piores”. Por outro lado, “se os alunos negros fossem ensinados pelos 25% dos melhores professores desapareceria a sua diferença para os alunos brancos”.

A escola faz sim uma diferença se… não persistir em

a) tratar todos os seus alunos como se eles fossem “homogéneos”,

b) conceber o conhecimento como se fosse único que estivesse pronto,

c) avaliar os alunos e as escolas como se existisse uma linha de chegada a ser franqueada ao mesmo tempo por todos.

Tratar os alunos como homogéneos é certamente uma herança dos tempos em que a prioridade era que todos frequentassem a escola. Não haveria muita disponibilidade para olhar diferentemente os alunos: era uma fase que quantidade. Por isso, agora que estamos noutro momento nos impressiona como esta ideia perversa de tratar os alunos como “homogéneos” pode persistir na organização das turmas, no ritmo e estratégias curriculares, no acolhimento de alunos com necessidades educativas específicas. Olhar os alunos como homogéneos (e os que visivelmente não o são, como “diferentes”) é uma herança doentia que nos traz muito mais prejuízos que vantagens.

Olhar o conhecimento como se ele estivesse pronto e só tivesse que ser transmitido a alunos ignorantes, é também um património que precisamos de prescindir. Hoje não é possível motivar todos os alunos exclusivamente por modelos transmissivos de conhecimento. Desde há muitos anos que muitos educadores têm chamado a atenção que, para o aluno se motivar e entusiasmar com o conhecimento, tem de ser implicado por situações-problema, por questões, por atividades, valorizando o seu papel como ator na sua própria aprendizagem.

Por fim, a escola faz diferença se puder ser suficientemente dúctil e próxima dos alunos acompanhando diferentes percursos: uns mais rápidos, outros menos, uns feitos por uns caminhos e outros por outros caminhos. Considerar que todos têm de chegar ao mesmo tempo ao mesmo lugar, não ajuda a escola a fazer a diferença: ajuda-a sim a criar e legitimar desigualdades.

Queremos pensar que estamos no bom caminho para entender que a escola não pode ser a parede granítica que é preciso escalar, mas um conjunto de percursos que possíveis (em terreno acidentado…) que é preciso fazer com motivação, como liderança e com apoio. Nesta conceção de valorizar os percursos, cabe referir como louvável e muito positiva a medida tomada pelo atual Ministério da Educação em avaliar as escolas não só em função dos seus resultados finais (os inefáveis rankings) mas levando em conta os lugares de onde se partiu. Sem olhar os percursos, a avaliação externa é injusta e incorreta.

Não podemos tratar igual o que é diferente. E agora, mais que nunca, estamos em posição (estamos na obrigação) de entender as diferenças para as podermos acolher com mais equidade.

David Rodrigues

Presidente da Pró – Inclusão – Associação Nacional de Docentes de Educação Especial. Conselheiro Nacional de Educação.

Fonte: Público

Medidas educativas no âmbito da valorização do interior do país

A Resolução do Conselho de Ministros n.º 72/2016, de 24 de novembro, em resultado do trabalho desenvolvido pela a Unidade de Missão para Valorização do Interior, aprova o Programa Nacional para a Coesão Territorial. Do leque de propostas, destacam-se as seguintes com algum impacto ao nível dos ensinos básico e secundário.

Denominação — Perspetivar escolas com turmas mais pequenas
Descrição da Medida — Realização de estudo prospetivo sobre o número de alunos por turma no sistema de ensino português (ao nível dos indicadores de abandono e insucesso escolar) tendo em vista flexibilizar o número de alunos por turma por forma a evitar a constituição de turmas compostas por vários anos letivos (1.º ciclo), e possibilitar, por concelho, a abertura de turmas por mais áreas curriculares e estimado o respetivo impacto orçamental. 
Área de Governação — Ministro da Educação. 
Principais Promotores — Ministro da Educação. 
Calendário — 2017. 
Articulações.

Denominação — Reforma dos Programas Curriculares
Descrição da Medida — Definir perfis de saída dos alunos do ensino secundário, proporcionando às escolas, num quadro de gestão flexível do currículo, criar conteúdos e disciplinas adequadas ao seu contexto territorial. 
Área de Governação — Ministro da Educação. 
Principais Promotores — Agrupamentos de Escolas/ Conselhos Municipais de Educação. 
Calendário — 2017. 
Articulações.

Denominação — Ensino profissional
Descrição da Medida — Adequação da rede da oferta do ensino profissional às necessidades de valorização do interior do território. 
Área de Governação — Ministro da Educação. 
Principais Promotores — Escolas (públicas e privadas)/ Entidades Intermunicipais/ANQEP, I. P./DGEstE. 
Calendário — 2017 e seguintes. 
Articulações

quarta-feira, 23 de novembro de 2016

PROPOSTA DE ESTRUTURA PARA UMA ESTRATÉGIA PARA A EDUCAÇÃO - Contramão Associação


No âmbito da publicação do Relatório de Progresso do Grupo de Trabalho para o desenvolvimento da Escola Inclusiva, resultante do Despacho n.º 7617, 8 de junho, a Contramão Associação divulga o documento PROPOSTA DE ESTRUTURA PARA UMA ESTRATÉGIA PARA A EDUCAÇÃO com um leque de propostas. Trata-se de uma documento bem estruturado e fundamentado, com propostas vinculativas para o desenvolvimento de uma eficaz educação inclusiva. 
Do leque das propostas apresentadas, nem todas merecerão consenso. No entanto, trata-se de um documento relevante para o debate que se deveria generalizar e não ficar circunscrito ao grupo de trabalho.

CRID/IPLeiria abre as portas e mostra como “Comunicar é possível… na diferença”

O Centro de Recursos para Inclusão Digital (CRID) da Escola Superior de Educação e Ciências Sociais (ESECS) do Politécnico de Leiria (IPLeiria) abre as suas portas no próximo dia 24 de novembro, a partir das 19h00, para mostrar à comunidade como “Comunicar é possível… na diferença”. 

«Queremos dar a conhecer e sensibilizar a população em geral para os diferentes modos de comunicar através do uso de diferentes tecnologias de apoio e a importância das mesmas na vida das pessoas com deficiência», explica Célia Sousa, docente da ESECS e coordenadora do CRID/IPLeiria.

Esta iniciativa é dinamizada no âmbito da Semana da Ciência e da Tecnologia, que decorre em todo o País entre os dias 21 e 27 de novembro. Instituições científicas, universidades, escolas e museus abrem as portas à sociedade para potenciar a observação científica e de contacto pessoal com especialistas de várias áreas de conhecimento.

O Centro de Recursos para a Inclusão Digital do IPLeiria destina-se a todos os cidadãos com necessidades especiais e seus familiares, marcando a diferença a nível regional, nacional e internacional. Pretende, entre outros, fomentar a utilização das TIC por parte de todos os cidadãos; contribuir para uma sociedade inclusiva capaz de dar resposta às diferentes necessidades que a diversidade de indivíduos atualmente apresenta; disponibilizar recursos que permitam analisar problemas ligados ao processo ensino/aprendizagem, e elaborar, implementar e avaliar as soluções desses problemas pelo seu desenvolvimento e exploração; responder a determinadas necessidades da comunidade, por vezes limitadoras em múltiplos aspetos, como a conversão de textos para braille, sinalética, entre outros, no sentido de diminuir as dificuldades e privilegiar a igualdade de oportunidades; e apoiar e cooperar com os PALOP na área da acessibilidade eletrónica para todos. É o único centro com estas características no País.

Fonte: Comunicado recebido por correio eletrónico

terça-feira, 22 de novembro de 2016

Docentes de Educação Especial podem ser afastados dos alunos

No seguimento da publicação do relatório de progresso do "Grupo de Trabalho para o desenvolvimento da Escola Inclusiva Despacho n.º 7617, 8 de Junho", o JN noticia dizendo que os docentes de educação especial vão ser afastados dos alunos, passando a exercer funções de conselheiros.

Fica a notícia retirada do Blog DeArLindo. O relatório pode ser acedido aqui.

Grupo de Trabalho para o desenvolvimento da Escola Inclusiva Despacho n.º 7617, 8 de Junho - Relatório de Progresso

Foi tornado público o Relatório de Progresso do Grupo de Trabalho para o desenvolvimento da Escola Inclusiva Despacho n.º 7617, 8 de Junho. Numa leitura na diagonal, prevêem-se algumas alterações significativas. No entanto, e tratando-se de um relatório de progresso, ficará para mais tarde uma análise mais aprofundada. 


segunda-feira, 21 de novembro de 2016

Que alterações estão a ser planeadas para o Decreto-Lei n.º 3/2008?

Muitos dos nossos sócios e seguidores nos têm interpelado para saber quais são as alterações que estão a ser planeadas à legislação em vigor (o chamado “3 de 2008”). Como é sabido, foi nomeado um grupo de trabalho que deverá já ter apresentado algum documento orientador das mudanças que se propõem na legislação. Este documento final do grupo de trabalho não foi divulgado e, por este motivo, não sabemos do seu conteúdo. Esperamos – é esta a expectativa que tem sido criada – que até ao final deste ano civil de 2016 exista um documento público que permita discutir alterações que melhorem o apoio aos alunos com necessidades educativas específicas e de maneira geral aos alunos que precisam de ter apoio para poderem cumprir a indispensável escolaridade. Ainda que sem conhecer este documento, gostaria de avançar alguns pontos de reflexão: 

Antes de mais penso que é de abandonar a ideia que estas alterações farão por si só as mudanças que são necessárias para melhorar o apoio aos alunos com dificuldades. Todos sabemos que, por muito corretas que sejam as leis, existe uma distância (que pode ser maior ou menor) sobre a sua publicação e o seu cumprimento. Não estamos convictos que seja esta mudança a que vai resolver todas as carências que existem no sistema educativo. Esperamos sim que estas mudanças aperfeiçoem e facilitem soluções mais adequadas. Estas mudanças, como sempre, são um caminho em que nada nem ninguém se pode intitular de infalível e de óbvio. Já António Nóvoa nos tinha alertado no seu livro “evidentemente” que esta palavra em Educação quer dizer que “o que é evidente… mente). 

Um segundo aspeto é o grande e atempado trabalho que a nossa associação produziu para ajudar a que estas decisões sejam adequadas. Lembro o documento que se encontra no nosso site e que foi extensamente apresentado na Assembleia da República no dia 8 de junho deste ano e extensamente divulgado entre toda a comunidade educativa e a “quem de direito”. A Pró – Inclusão antecipou e suscitou uma discussão profunda e alargada sobre quais os fatores que consideramos necessários para melhorar a Inclusão nas escolas. Se tiverem dúvidas vão por favor ao nosso site. Está lá feito - e há muito tempo – o nosso trabalho de casa. 

Finalmente é importante que, uma vez mais, nos capacitemos que o desenvolvimento da Inclusão não se passa sem uma decidida e sensível melhoria no sistema educativo em geral. Sempre que pensamos no que é preciso mudar para os alunos com dificuldades, defrontamo-nos com mudanças que, para ser efetivas, teriam que abranger toda a escola. Exemplos? A diferenciação do currículo? A avaliação? E muitos mais poderiam ser aduzidos. 

Aguardamos, pois, o documento com uma expectativa moderada. Este não será o último documento a sair, e pensamos – optimistamente – que o que vai ser discutido e depois publicado – não é mais do que um degrau mais para subirmos uma escada longa e exigente. 

Só uma questão final: dissemos “discutido e publicado” porque para a Pró–Inclusão não faz sentido (como já se fez antes) conhecer a legislação quando se consulta o “Diário da República”.

David Rodrigues

Editorial da Newsletter de NOVEMBRO de 2016, N.º 103, da Associação Nacional de Docentes de Educação Especial

domingo, 20 de novembro de 2016

O tempo dos pequenos prisioneiros

Não fosse um sinal dos tempos e consideraríamos ridículo escrever um texto sobre a importância de as crianças brincarem. Afinal, não é isso o que elas fazem? A resposta é assustadoramente simples: não. E não é o que fazem, sendo isso o que elas são. Nada mais definidor da infância do que o brincar e, no entanto, nada menos preponderante na infância destes dias, escolarizada até ao tutano, compartimentada em atividades sempre organizadas pelo adulto, em casa sujeita ao regime de trabalhos de casa-TV-telemóvel-tablet antes de deitar e, de manhã, começar tudo de novo. Este ano, um filme patrocinado pela marca Skip entrava numa prisão de alta segurança dos Estados Unidos e mostrava um grupo de reclusos perturbados com a mera possibilidade de se retirar uma hora às duas horas diárias de tempo ao ar livre a que estão habituados. “Seria uma tortura”, dizia um deles. Mas 70% das crianças têm menos de uma hora por dia de brincadeira, concluiu um estudo da mesma marca. Menos, portanto, do que o tempo mínimo que o Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos recomenda para garantir o bem-estar dos prisioneiros.

“Temos uma criança mais centrada nos dedos do que na locomoção, que é corporalmente passiva e sofre de iliteracia motora”, diz Carlos Neto, investigador da Faculdade de Motricidade Humana. A estudar este assunto há duas décadas, não constitui para ele novidade que as crianças de hoje sejam mais frágeis, mais imaturas e menos capazes de se controlar e autorregular. “As crianças são dotadas para brincar, é o seu estado natural. Precisam de ser perseguidas, de perseguir, lutar, correr, esconder-se, inventar. E a sociedade faz um esforço para as ter quietas e em silêncio”, comenta o especialista. Num quadro de quase permanente institucionalização, em que os mais novos passam na escola quase tantas horas diárias quanto um adulto no trabalho — de 27,5 a 30 horas semanais nos 1º e 2º ano do 1º ciclo e até 32,5 horas no 3º e 4º ano —, a configuração do seu tempo livre nesse espaço revela-se determinante. E a escola “ainda trata o recreio como algo avulso ao processo de ensino”, sem perceber que “o tempo para brincar deve ser bem estruturado e encarado como um contributo para se aprender dentro da sala de aula”.

No jardim de infância a situação é semelhante. Em Portugal, de fevereiro a maio — a estação invernal — as crianças passam apenas uma média de 10,8% do seu tempo em espaço exteriores, mais apetecíveis para a brincadeira livre. Este é um dos dados que constam do estudo “Interação Criança-Espaço Exterior em Jardim de Infância”, da autoria de Aida Figueiredo. A professora da Universidade de Aveiro concluiu ainda que, nas creches observadas, os bebés com menos de um ano só saíram ao exterior duas vezes em quatro meses. O estudo serve também para comparar realidades educativas opostas: se na Noruega, por exemplo, são exigidos entre 24,2 e 33 m2 por criança, em Portugal apenas são previstos 4 m2 por criança.

Quando é que o brincar livremente se tornou a atividade mais rara, menos praticada, na vida das crianças? E quando é que este quadro negro passou a ser encarado como normal? “O que não é normal é não se olhar para as crianças como cidadãos com direitos, isto é, com direito ao tempo livre e a fazer o que é próprio na infância: brincar, correr e dialogar com outros”, frisa Maria José Araújo. Para esta especialista em educação e professora no Instituto Politécnico do Porto, chegamos a um ponto em que o ato de brincar é excedentário e conotado como “fútil” pelos adultos, cuja ideia de competência “passa por estruturar a vida das crianças, não respeitando as suas necessidades nem proporcionando as condições para elas poderem brincar”.

E brincar está longe de ser fútil. “É uma atividade completa, em que as crianças aprendem a decidir, a negociar, a colaborar, a pensar e a criar; descobrem o que querem e como querem fazer; elaboram e exprimem as suas fragilidades e traumas; e começam a ler a realidade social, a interpretá-la e a agir sobre ela”, diz a investigadora. Pelo contrário, o não brincar ocasiona danos profundos no ser humano: “Gera crianças mais obesas, mais sentadas, com menos competências sociais e relacionais, mais isoladas e individualistas, e que em adultos estabelecem relações mais difíceis.” Promove, igualmente, uma pandemia de crianças cansadas e stressadas que acabam sendo alvo de medicação. “Estes miúdos vão para a sala de aula brincar, extravasar, porque não lhes foi dada outra hipótese. Então, medicamo-los para que sejam mais concentrados. Ora, uma criança que não brinca não aprende a concentrar-se”, reflete.

A neuropediatra, Manuela Santos, ressalva, por sua vez, a diferença entre brincadeira e entretenimento: “Hoje em dia vivemos o drama do tablet. As crianças habituam-se a olhar para um ecrã durante horas. É como ir ao ginásio e só mexer uma perna.” Do ponto de vista do desenvolvimento, esse tipo de interação com o mundo ‘enche’ a criança de respostas automáticas, inibindo-lhe a criatividade e abrindo caminho para uma maior incidência de problemas mentais no futuro. Carlos Neto aponta também a fraca capacidade empreendedora e a escassa autoestima de quem em pequeno não exercitou o brincar. E alerta: “A energia das crianças é natural e deve ser tolerada pelos adultos. O ser humano não nasceu para estar quieto. Estamos a criar monstros.

70
É a percentagem de crianças portuguesas que passam menos tempo ao ar livre do que os 60 minutos que 
o Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos 
recomenda para os reclusos.

10,8
É a percentagem de tempo médio que as crianças de creches e jardins de infância passam no exterior durante os quatro meses do inverno.

2
É o número de saídas ao exterior dos bebés com menos de um ano nas creches, durante os quatro meses do inverno.

32,5
É o número de horas semanais de aulas previsto na Matriz Curricular do 1º ciclo para os alunos do 3º e 4º ano, incluindo as atividades de enriquecimento curricular.

8
é o número de horas de brincadeira por semana que as crianças de todo o mundo perderam nos últimos 20 anos.


Fontes: Estudo SKIP — “Os Valores Das Crianças”, 2016; “Interação Criança-Espaço Exterior Em Jardim De Infância”, de Aida Figueiredo, 2015; Matriz Curricular Do 1º Ciclo, Direção-Geral Da Educação, 2016

Fonte: Expresso por indicação de Lvresco