quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

“Tenho aqui um bocadinho de dislexia.”

Disortografia, disgrafa, discalculia, mas especialmente dislexia, são palavras que inundam o vocabulário escolar. É comum ouvir: “É que eu tenho um bocadinho de dislexia”. A verbalização destas “Dis” vem dos professores, vem dos pais, vem dos psicólogos e tornou-se, diria, “viral”. O saco desta temática não tem fim, nem parece ter fundo. Ganha-se muito dinheiro e pior, induz em erro muitas pessoas.

Não me quero alongar nas particularidades desta dificuldade específica de aprendizagem. Deixo dois links onde já tive oportunidade de me debruçar detalhadamente sobre este tema.



Na altura de Estado Novo falava-se na importância de saber ler, escrever e contar. Estes sim eram os três pilares fundamentais no 1.º ciclo. Sem querer, sequer, cair num milímetro que seja na defesa do antigo regime tenho de reafirmar que existe uma urgência latente em fazer regressar um espaço dedicado a, reafirmo, duas bases fundamentais do acesso ao conhecimento e liberdade: leitura e escrita.

Reféns do tempo apertado para cumprir com o programa, responder às metas exigidas, alunos e professores boicotam-se permitindo um avanço em lacunas graves de aprendizagem, consolidação e descoberta de regularidades.

Ao longo do meu percurso em Educação Especial consigo encontrar uma linha exponencial entre os primeiros relatórios que recebi no início da minha profissão e aqueles que recebo agora. Deixou-se de falar em perturbações de linguagem, em faltas de consolidação da leitura e escrita e encravámos o carimbo nas “Dis”. Com um rótulo retirámos responsabilidades, retirámos intervenção e assinamos um atestado de incapacidade onde anulamos à partida o trabalho que pode ser desenvolvido e classificamos como “doença irrecuperável”.

As metas de aprendizagem têm sido um foco de discórdia não reunindo consensos positivos. No meu entender são exigentes e não delegam o espaço necessário à maturação destas competências – base dificultando o acesso à informação. Devido ao aumento da carga letiva, no 1ºciclo, de temas que são novamente abordados no 2ºciclo diminuiu-se o tempo e espaço que deve ser dado ao desenvolvimento destas competências fundamentais. Os resultados são as dificuldades comprovadas nestas áreas ao longo do 2º e 3 ciclo dificultando o acesso à informação de muitos jovens ao mesmo tempo que são rotulados com perturbações do âmbito da leitura e escrita que poderiam ser evitadas e trabalhadas atempadamente.

Por isso, uma das medidas educativas que continuo a reiterar é refletir e reestruturar as metas de aprendizagem para o 1ºciclo no sentido de atribuir mais espaço à aprendizagem e desenvolvimento das competências essenciais.

Respeitemos as “Dis” e deixemo-las em paz ajudando-as a encontrar o seu espaço. Unamos esforços e poder de reflexão para perceber as dificuldades reais e compreender que em educação nada é preto ou branco e é preciso ler nas entrelinhas e de preferência com tempo.


Fonte: ComRegras

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